ainda a recordar epopeias

"Olhamos tudo em silêncio na linha da praia
De olhos na noite suspensos do céu que desmaia;
Ai lua nova de Outubro, trazes as chuvas e ventos,
A alma a segredar, a boca a murmurar tormentos!

Descem de nuvens de assombro taínhas e bagres
Se as aves embalam os peixes em certos milagres;
Levita-se o corpo da alma, no choro das ladainhas,
Na reza dos condenados, nas pragas dos sitiados,
Na ilha dos ladrões, quem sai?
E leva este recado ao cais:
São penas, são sinais. Adeus.

Livra-me da fome que me consome, deste frio;
Livra-me do mal desse animal que é este cio;
Livra-me do fado e se puderes abençoado
Leva-me a mim a voar pelo ar!

Como se houvesse um encanto, uma estranha magia,
O sol lentamente flutua nas margens do dia.
Despe o meu corpo corsário, seca-me a veia maruja,
Morde-me o peito aos ais, das brigas, dos punhais,
Da ilha dos ladrões, quem sai?
E leva este recado ao cais:
São penas, são sinais. Adeus.

Andamos nus e descalços, amantes, sedentos
Se o véu da noite se deita na curva do tempo.
Ai lua nova de Outubro,
Os medos são medos das chuvas e ventos,
Da alma a segredar, da boca a murmurar

Adeus"

"A ilha", Fausto

arquivos da memoria, em tempos de cagaço

Todas as semanas 50 pares de olhos. Olhares curiosos, olhares entediados, de escárnio, de tesão, de ressaca, de dormência, de cansaço. Esperam que eu os ensine, que os desembarace, que os proteja. Eu não sei nada. Sou patética no meu estrado, de giz na mão, com calafrios na barriga e uma cobarde a suspirar de alívio por eles não terem cheirado o meu medo, nem terem visto a minha ignorância. São eles que me ensinam tudo. E por eles atravesso labirintos na cidade subterrânea que cheira a merda, a ratos e a leite azedo. Vejo as caras madrugadoras, os olhos remelosos, as olheiras e a pele amarela privada do sono, os corpos que se arrastam. E depois a cidade abandona-se fora dos muros aos nomes cuspidos, escarrados da raiva de quem os condenou a chamarem-se assim: Nogent le Perreux, Noisy-le-Sec, Rosny sous Bois, Fontenay sous Bois. E depois as cités: les jardins, les boulereaux. Têm nomes de flores e de bosques que são ditos com voz de nojo e tom de vergonha. Lembro-me do quanto odiei esses prédios altos, iguais uns aos outros, de como temi o arrastar gingado daqueles corpos a defenderem-se da imobilidade de outros, os ouvidos entupidos de ritmos céleres a consolarem-se da mudez de outros, o olhar fixo e frio a defender-se da frieza do mundo. Villiers sur Marne le Plessis Trévise. Chego ao meu destino. Ainda me falta esperar pelo autocarro que atravessa a zona industrial, quase debruçada na cité que ainda dorme. Essa cité que aprendi a amar e respeitar de longe, tão importante de atravessar quanto o desgostoso Val de Marne.


Escrito em 2006 num outro blog. Dentro de uma semana e meia tenho mais 50 pares de olhos. vão ser mais velhos, provavelmente mais atentos e calmos. Eu continuo com o mesmo vulcão de agonia.

Como dizia o Fausto "E na verdade o que [nos] dói /É que não queremos ser heróis"

apetites

3h da manhã, depois de duas torradas com manteiga e um iogurte magro:

Estômago:
- MAIS!

Cérebro:
-Não, besta, estás de dieta!


(é sempre uma luta... meia frustrada)

Séries

Tenho uma capacidade anormal de ver séries de merda.
Nada de telenovelas, mas sim séries americanas de qualidade duvidosa (que vejo até ao fim!).
Hoje descobri isto:

Steven Seagal - Lawman




A sério, é demais... Um sério candidato ao 1° lugar do meu top 10 - séries merdosas!

Miep Gies (1909 - 2010)



"Je ne suis pas un héros, affirmait Miep Gies le jour de son centième anniversaire, le 15 février 2009. J'ai seulement fait ce que j'ai pu pour aider."


artigo no Le Monde

Presque en route

Mudar, nomadizar, repensar, abanar a barraca interior, arriscar. E desabafar com malta que está ainda mais nómada e mais longe. Assim escrevia eu a uma amiga:

«às vezes é muito difícil gerir os vários departamentos da vida. resta-me entregar-me ao tempo, como entregamos os corpos ao mar no Verão, deixar a vida fluir, soltar as rédeas e aceitar a minha condição de gente sem poderes divinos, aceitar que não posso controlar tudo, deixar o dia-a-dia equilibrar o cérebro, o coração e os quadris.
Depois manda a nova morada em NY, para eu te escrever de Paris.

Beijinhos»

Aceitar o acaso e o imprevisto. Não ser herói nem imortal.

Acho que afinal de contas não sou assim tão ateia, porque cada vez que me sinto desnorteada procuro respostas na lógica bruta, profunda, cruel e sem caridade do Olimpo. A minha dificuldade de crença e descrença prende-se ao facto de eu encontrar mais verdade na ficção do que na realidade. No fundo, sou só uma desajustada sem grande fé e com muita imaginação.

Uma boa bomba

Hoje acordei com uma noticia, uma bomba. Daquelas que nos faz abanar o mundo e olhar para a vida como uma fluidez diferente da habitual, com a esperança de quem tem (quase) 30 e o mundo pela frente. Vai haver reunião de muff's em Paris, vai haver jantares no indiano, muita fartazana e muitas mudanças. Ontem à noite estava a ler o Chatwin (aquele livro que eu estou a ler) e na pág.130 ele escreve que "Diversão. Fantasia. Mudança de moda, de comida, de amor e de paisagem. Precisamos dela como do ar que respiramos. Sem mudança, os nossos cérebros e corpos deterioram-se." é essa a essência de nomadizar. Precisar da mudança, ou basicamente não estagnar. Por isso muff, cá vamos nós, primeiro tu, depois eu; andarmos por ai a girar à volta do mundo, em sintonia com o universo que também ele se move, esticando ou encolhendo conforme lhe doa os calos. Cá te espero.


outra visão de Avatar - artigo Rue89

« Avatar » contre Cohn-Bendit : l'écologie doit être anticapitaliste

Une image du film "Avatar", de James Cameron

Après l'échec du Copenhague institutionnel et la vivacité du Copenhague mouvementiste, on peut être tenté de se tourner vers la vitrine du marketing électoral d'Europe-Ecologie. La bonne nouvelle ne viendrait-elle pas plutôt, et paradoxalement, d'un vieux routier de l'industrie hollywoodienne, James Cameron, avec son « Avatar » ?

En 1998, dans « Une envie de politique » (La Découverte), passé alors du statut d'icône soixante-huitarde à celui d'inspirateur d'un capitalisme vert, Daniel Cohn-Bendit écrivait ceci :

« Ce que la gauche doit donc faire valoir aujourd'hui, c'est que cette évolution a des aspects destructeurs, car la production menace de détruire la planète. Faire cette démonstration n'est pas facile, mais on peut le faire au nom même de l'économie de marché, car je suis pour le capitalisme et l'économie de marché. »

Pas le plus écolo, Marx pointait déjà la contradiction capital/nature

En se faisant le chantre d'un capitalisme chlorophyllisé et d'une écologie politique chloroformée, l'agité du bocage politicien a rejoint les rangs d'une défense consensuellement aseptisée de la nature : les Al Gore, Yann Arthus-Bertrand, Nicolas Hulot et autres Jean-Louis Borloo.

Marx, quelque peu fasciné par le productivisme industriel de son époque, n'était pas exempt d'ambiguïtés quant au rapport capitalisme/nature. Toutefois, il avait également commencé à percevoir une des contradictions principales travaillant le capitalisme en interaction avec la contradiction capital/travail : la contradiction capital/nature.

Ainsi, pour lui, la production capitaliste épuisait « les deux sources d'où jaillit toute richesse : la terre et le travailleur » (« Le Capital », livre I, 1867).

Pour Gorz, impossible d'éviter la catastrophe sans rupture radicale

André Gorz prolongea cette analyse en notre début de XXIe siècle : « La question de la sortie du capitalisme n'a jamais été plus actuelle », écrit-il dans « Ecologica » (éd. Galilée, 1998). Et d'ajouter par avance contre une possible cohn-benditsation de la radicalité écologiste :

« Il est impossible d'éviter une catastrophe climatique sans rompre radicalement avec les méthodes et la logique économique qui y mènent depuis cent cinquante ans. »

C'est dans une telle perspective que s'est récemment situé le journaliste Hervé Kempf : « Pour sauver la planète, sortez du capitalisme » (éd. du Seuil, 1999).

« Avatar » : Hollywood dans la galaxie anticapitaliste ?

Les dénonciations gauchistes du capitalisme hollywoodien sont si courantes que les esprits anticapitalistes pourraient avoir du mal à reconnaître des potentialités critiques dans une de ses productions. Et pourtant…

A des années-lumière de la Terre, la planète Pandora est sous colonisation américano-occidentale. Un minerai rare suscite la convoitise d'une multinationale (« The Company », comme dans la série des « Aliens »), appuyée par des troupes militaires.

L'argument de la rentabilité financière (la rétribution des actionnaires est directement évoquée dans le film) pousse à la double destruction de la nature et du peuple Na'vi. Ecocide et génocide constituent ici un double horizon de la logique du profit.

Cameron met en quelque sorte en images et en son une forme extrême de la contradiction capital/nature. La trame narrative de la science-fiction, reconfigurée avec de nouveaux effets spéciaux numériques, projetée en 3D, donne une vérité éthique et politique proprement cinématographique à une composition fictionnelle.

Une critique sociale, sur un plan sensible et intelligible

Ce dispositif cinématographique nous permet d'explorer au plus près de nos sensations un autre monde, celui de Pandora et des Na'vis, en jouant tour à tour sur la frayeur, la surprise ou la joie de la découverte. La critique sociale s'exprime sur un double plan sensible et intelligible.

Cet univers étrange en 3D, qui nous fait d'abord peur, puis nous émerveille, constitue moins un des « autres mondes possibles » des altermondialistes que l'envers de notre propre monde, un lieu imaginaire qui permet de mieux repérer les failles de notre réalité quotidienne à la manière de l'île d'Utopia chez Thomas More.

Certes les Na'vis ont comme un parfum New Age, traînant une vision stéréotypée de la communion de « primitifs » et de la nature. Mais le savoir-faire particulier des auteurs les plus originaux des films et des séries télévisées hollywoodiens consiste justement à prendre appui sur certains stéréotypes pour en interroger d'autres.

Nous sommes pris par la main dans la familiarité d'autoroutes standardisées, mais ça et là s'ouvrent des sentiers critiques, dans un cocktail détonnant de douces évidences et de piments plus corsés.

Sully vit une conversion existentielle, comme ces militants anticapitalistes…

L'anticapitalisme d'« Avatar » est indissociablement collectif et individuel. Se désintoxiquer de l'imaginaire capitaliste passe aussi par une transformation de soi. Jake Sully (Sam Worthington, déjà remarqué dans « Terminator 4 »), ancien marine immobilisé dans un fauteuil roulant devenant « pilote » mental d'un avatar (corps hybride d'ADN humain et de Na'vi), va connaître une véritable conversion : d'inflitré chez les Na'vi à protecteur de leur mode de vie, de soldat impérialiste à eco-warrior.

Sully a quelque parenté avec la figure des « militants existentiels » anticapitalistes, caractérisée « par un travail spirituel et politique de chacun de nous sur lui-même, soutenu par des communautés de vie », promue récemment par le philosophe de l'économie Christian Arnsperger dans son stimulant ouvrage « Ethique de l'existence post-capitaliste » (éd. du Cerf, 2009).

Cette révolution culturelle personnelle prend les chemins de la fragilité dans « Avatar » : un handicapé à l'âme guerrière, fasciné au départ par les capacités supposées illimitées de son avatar, finira par assumer ses faiblesses d'être humain mortel.

Une écologie radicale, loin des niaiseries de Borloo ou Cohn-Bendit

Cepedant, Cameron ne suivrait pas Arnsperger dans son choix de la conversion existentielle contre la voie révolutionnaire classique des rapports de forces.

Dans une conjoncture de menace extrême, « Avatar » justifie le recours au combat et à la force. Dans certaines circonstances, l'anticapitaliste vert conséquent doit aussi savoir prendre les armes (au sens métaphorique, n'impliquant pas nécessairement le maniement de la kalachnikov).

Cette écologie radicale n'a pas grand-chose à voir avec les niaiseries consensualistes de l'arc Borloo/Cohn-Bendit. Elle appelle des clivages, des conflits, des affrontements. La transformation personnelle et l'action collective contre les forces dominantes apparaissent associées et non pas opposées.

Photo : une image du film « Avatar », de James Cameron

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